E agora, o que será da semana de 4 dias?

Há muito em aberto. Mas uma coisa parece evidente: para vivermos uma vida plena, não nos basta durar, sobreviver, trabalhar. Ganhar tempo para viver é uma das conquistas mais importantes que existem, porque dela depende também, em grande medida, a nossa liberdade verdadeira

e agora, o que será da semana de 4 dias?

E agora, o que será da semana de 4 dias?

No próximo mês de junho será apresentado o relatório final dos projetos-piloto sobre a semana de 4 dias em Portugal, num encontro internacional que terá lugar na Universidade do Porto. O momento tem particular importância. Desde logo, porque é a oportunidade de debater esta experiência portuguesa e de compará-la com as que tiveram lugar noutros países - basta lembrar, por exemplo, que na Nova Zelândia, Espanha, Escócia, Bélgica, Reino Unido, Japão ou Islândia também se testou este modelo de organização do tempo de trabalho. Mas a relevância do debate público prende-se ainda com o contexto de indefinição política que vivemos, em que esta experiência pode ser ampliada ou interrompida.

O anterior governo lançou, no final de 2022, um projeto-piloto para a semana de quatro dias no setor privado, contando com a parceria técnica da fundação 4 Day Week Global e com a coordenação de Pedro Gomes, professor da Universidade de Londres, a que se juntou Rita Fontinha, da Universidade de Reading. Ao Instituto do Emprego e da Formação Profissional coube a responsabilidade pela implementação e gestão do programa, que decorreu no segundo semestre de 2023. A experiência teve duas condições de partida muito importantes: a transição para a semana de 4 dias deveria estar associada a uma redução do horário semanal (ou seja, não poderia corresponder a uma mera concentração das mesmas 40 horas em menos um dia) e não poderia implicar qualquer perda de remuneração.

O projeto avançou. Para além das empresas que adotaram os 4 dias semanais com o programa-piloto, outras introduziram esse modelo mesmo antes daquele programa. Os resultados foram divulgados no final de 2023, num relatório intermédio com dados bastante eloquentes. O projeto abrangeu 41 empresas e mais de 1000 trabalhadores. Em média, a semana de quatro dias envolveu a redução das horas de trabalho semanais de 39,3 para 34 horas. A maior parte das empresas optou por um dia livre por semana (58,5%), outras por quinzenas de 9 dias. À implementação da semana de 4 dias foram associadas, na maioria das empresas, mudanças organizacionais (redução do número de reuniões, novo software, etc.) e a esmagadora maioria (95%) avalia a experiência positivamente e pretende prolongá-la. Num inquérito respondido por uma amostra de 200 trabalhadores, estes declararam a diminuição de sintomas negativos a nível de saúde mental, ansiedade, insónia ou problemas de sono, a redução dos níveis de exaustão pelo trabalho (-19%) e uma melhor conciliação entre trabalho e família (65% dos trabalhadores passou mais tempo com a família após o início da redução horária). A semana de 4 dias passou a ser também um fator muito relevante para a maioria dos trabalhadores na escolha de se manterem na empresa.

Até ver, o projeto foi, globalmente, um sucesso, mesmo que haja diferenças em função das empresas, dos setores e das categorias de trabalhadores. A grande vantagem de termos tido este programa é todavia, e desde logo, o facto de podermos tomar decisões com base em factos, e não apenas em desejos ou em preconceitos.

Em Portugal, o período normal de trabalho já não sofre alterações desde 1996 (já lá vão quase 30 anos!), ano em que se passou das 44 horas para as 40 horas semanais. Desde essa data, apesar do aumento da produtividade e de toda a tecnologia incorporada nos processos produtivos, a tendência parece ser de expansão de facto do tempo de trabalho. A redução do tempo de trabalho, que é uma conquista civilizacional, desacelerou.

Em 2012 foram reduzidos os dias de férias previstos na lei geral, de 25 para 22. A idade da reforma aumenta todos os anos, em função da esperança de vida (a exceção foi o ano da pandemia). Nas últimas duas décadas multiplicaram-se horários atípicos e modalidades flexíveis, com a generalização dos bancos de horas, das adaptabilidades e dos turnos em vários setores. Por outro lado, as novas tecnologias têm promovido uma cultura de conexão permanente, em que o tempo pessoal é informalmente colonizado por solicitações permanentes relacionadas com o trabalho, através dos computadores e dos omnipresentes smartphones. Nas plataformas digitais, o tempo de disponibilidade, não remunerado, parece não ter limites: muitos trabalhadores das entregas ou dos transportes ficam 12 ou 14 horas ligados à aplicação digital, sem feriados nem fins de semana.

Vivemos por isso um paradoxo no que ao tempo de trabalho diz respeito. Teríamos, em princípio, condições para trabalhar menos produzindo o mesmo ou até mais, mas a desregulação dos horários, a cultura de conexão digital e a dissolução das regras contratuais estão a fazer-nos trabalhar mais. A semana de 4 dias veio na contramão da tendência de expansão do tempo efetivo de trabalho. Daí a atenção que merece. Saudemos pois que se produza mais conhecimento sobre os processos concretos da sua aplicação. Ele é essencial para podermos discutir de forma mais sólida o que fazer daqui para a frente.

Os sinais que vieram do Parlamento esta semana não são auspiciosos. Na passada quarta-feira, PSD, CDS e Chega juntaram-se para chumbar recomendações que instavam o governo a prosseguir com a experimentação da semana de 4 dias. Será que, apesar do sucesso global do programa-piloto em algumas empresas privadas, o novo Governo vai querer interromper este processo, desperdiçando os ganhos obtidos e não avançando para o piloto que estava prometido para a administração pública? Ou será que, apesar do chumbo das recomendações no Parlamento, a experiência da semana de 4 dias se vai expandir, até um dia haver força e vontade para inscrevê-la na lei geral? Independentemente do que faça o governo, irá o movimento sindical adotar esta reivindicação, a par da luta mais antiga pelas 35 horas e contra a precarização dos horários? E do lado das empresas, haverá algum efeito de contaminação de novas organizações, ao saberem dos resultados daquelas que decidiram aplicar esta prática?

Há muito em aberto. Mas uma coisa parece evidente: para vivermos uma vida plena, não nos basta durar, sobreviver, trabalhar. Temos direito, como diria o Bernardo Soares do “Livro do Desassossego”, a sermos mais “donos das nossas horas”. Pelo menos, um pouco mais do que somos hoje. Ganhar tempo para viver é uma das conquistas mais importantes que existem, porque dela depende também, em grande medida, a nossa liberdade verdadeira.

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