Pedro Duarte (MIGUEL A. LOPES/LUSA)
O “embuste” voltou ao Parlamento, mas o ministro das Finanças e o primeiro-ministro não estavam lá para ver. Joaquim Miranda Sarmento teve de ir aos Estados Unidos para a reunião do Fundo Monetário Internacional (FMI), deixando a primeira grande polémica do Governo nas mãos do ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte. O “embuste”, palavra do PS desde que o caso espoletou, é o alívio no IRS.
E “embuste” foi precisamente a palavra utilizada pela líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão, que insistiu na expressão referida pelo secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, para definir a proposta do executivo de Luís Montenegro.
“Não vale a pena argumentar: o aproveitamento propositado de uma ambiguidade voluntária é um embuste (…) que enganou jornalistas, analistas e a maior parte dos portugueses”, disse a deputada, referindo-se a um alívio fiscal que afinal vai ser de apenas cerca de 200 milhões adicionais, juntando-se aos 1.327 milhões que já tinham sido aprovados no Orçamento do Estado elaborado pelo anterior Governo, e que se encontra em vigor.
Mariana Mortágua, por sua vez, optou pela palavra “ficção” para classificar a forma como foi anunciada a redução do IRS, e acusou o executivo de consentir a sua propagação.
“Em janeiro a comunicação social escrevia que o cenário macroeconómico da AD sustentava o crescimento económico num choque fiscal de três mil milhões em IRS (…). O Governo criou a ficção e deixou que se instalasse a ficção”, referiu a coordenadora nacional do Bloco de Esquerda.
Os ataques surgiram também das bancadas mais à direita, com a Iniciativa Liberal a apontar o dedo à AD pela falta de ambição na reforma fiscal e por não querer “esclarecer os portugueses” neste tema.
“Se eu aqui chegar e lhe disser que lhe vou oferecer 150 euros no mês de maio, o sr. ministro [Pedro Duarte] tem a legítima expectativa que eu lhe ofereça 150 euros. Não fazer isso e entregar-lhe 20 euros, dizendo que o senhor já tem no bolso 130 que lhe foram entregues em janeiro por António Costa, convenhamos que não é a mesma coisa”, atirou Rui Rocha, que salientou que o seu partido foi o “único” que notou que os 1.500 milhões de euros de redução prometidos pela AD incluíam o Orçamento do Estado do PS. E é verdade: foi o deputado Bernardo Blanco quem notou a questão, ficando sem resposta do Governo nesse debate, que serviu para aprovar o programa do executivo.
Mais contido na ofensiva, principalmente dirigida ao PS, o Chega desafiou o Governo a esclarecer o que pretende fazer em matéria de IRS, e criticou a ausência de Miranda Sarmento.
“Quem deveria estar aqui era o ministro das Finanças. [Esta situação] nasce de um equívoco que não foi sua [do ministro dos Assuntos Parlamentares]. Foi de um ministro das Finanças que vai à televisão dizer uma coisa ligeiramente diferente do que disse ao resto do país”, afirmou o líder André Ventura.
Alexandra Leitão também mencionou a ausência do ministro do PSD, facto que considerou “lamentável”. “Ainda agora tomaram posse e já se furtam a dar explicações ao Parlamento e aos portugueses. (…) Este é um Governo que, menos de duas semanas depois de tomar posse, já perdeu a credibilidade e minou a sua relação de confiança com os portugueses”, afirmou.
“Nunca falámos em choque fiscal”
Do outro lado, o PSD não perdeu muito tempo a justificar a ausência do ministro e mencionou brevemente, através de Hugo Carneiro, que este se encontra “em representação de Portugal junto das instituições internacionais”, e apontou a mira ao PS. Já Hugo Soares destacou a ausência de declarações de Fernando Medina sobre a polémica que tem marcado os últimos dias da vida política nacional.
“Tem sido das poucas vozes que não se tem ouvido sobre esta matéria”, disse o líder parlamentar do PSD, sobre o anterior ministro das Finanças. “Talvez tenha sido o único que estudou o programa eleitoral da AD e o programa do Governo”, ironizou.
O Governo também começou por carregar nos socialistas, aproveitando as declarações de Alexandra Leitão para marcar a sua posição.
“Este debate é um embuste. É um embuste porque resulta de uma tática utilizada por quem anunciou que o tempo das táticas tinha acabado. A tática é transformar uma notícia boa para os portugueses numa notícia má”, afirmou o ministro dos Assuntos Parlamentares.
Pedro Duarte afirmou que, com a AD, há portugueses que vão ter a sua segunda redução do IRS do ano. “Essa boa notícia só existe porque a AD ganhou as eleições. Prometemos um alívio fiscal com sentido de responsabilidade. Nunca falámos em choque fiscal precisamente porque respeitamos o equilíbrio orçamental”, acrescentou.
Em resposta aos esclarecimentos do ministro, Mortágua referiu que não são os “jogos de semântica que vão livrar o Governo de responsabilidades”, e o deputado socialista Miguel Cabrita pressionou a tecla da mentira “deliberada” contada aos portugueses.
“A semântica é irrelevante. Embuste, manipulação, ardil, pode-lhe chamar o que quiser. O facto é que as pessoas se sentiram enganadas e não é possível pretender que não foi deliberado. Está ferida a credibilidade do Governo”, afirmou.
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