Comemorações – O imperdoável esquecimento de Mário Soares

Esquecer Mário Soares, por estes dias, é um crime de lesa majestade. Tiveram de ser Aguiar Branco e Marcelo Rebelo de Sousa a deixar-lhe palavras que, da tribuna, a sua família política lhe negou

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Comemorações – O imperdoável esquecimento de Mário Soares

Pedro Nuno falhou. E falhou quando não podia ter falhado.

O discurso de Pedro Nuno Santos, nas comemorações dos 50 anos do 25 de Abril, era demasiado importante para ser uma coisa panfletária, para ser escrito por parcas mãos que entendem pouco do passado, que olham o presente por meia dúzia de ideias tocantes, mas que não conseguem perspetivar o futuro com alegria e ambição.

Foi até dorial ouvir frases e palavras que no PS tinham ficado nos textos da Esquerda Laboral (uma pequena minoria interna) que terminou em 1981. E muito pior, o facto de não ter havido um só momento em que a esperança, o sorriso e a poesia se conseguissem entrever.

Quem faz as elocuções a Pedro Nuno pode pensar que assim vai conseguir ganhar o futuro, mas haverá sempre uma Mariana Mortágua a quem os mesmos temas saem melhor, existirá sempre um Rui Tavares com uma criatividade e um saber dizer que até o ruralismo consegue alcançar.

Não podia ser assim, não pode ser assim, não poderá mais ser assim.

Mas o maior erro de Pedro Nuno não tem indulto.

Num discurso que teve o dobro do tempo concedido, em que logo aos quatro minutos perdeu o auditório, não houve uma só palavra para aquele que é o construtor completo da nossa liberdade – Mário Soares.

Nada do combate pela democracia desde Norton de Matos, nada do exílio e do desterro, nada do Portugal Amordaçado (só este citado concederia ideias fortes), nada da legalização de todos os partidos (sempre com o PCP autorizado), nada da luta contra o “gonçalvismo”, nada da aceitação de um militar como Presidente, nada da construção da alternância a partir de 1979, nada da revisão constitucional de 1982 que fez o Abril definitivo, nada da entrada na União Europeia. Nada!

Nada, nem sequer o nosso papel na Europa e no Mundo de hoje, as guerras, as fomes, os cuidados com as flores a murchar que são cada uma das democracias espalhadas pelo mundo. Nem ONU, nem Guterres.

Pedro Nuno falhou. E falhou porque não podia ser uma quase citação de Sophia a salvá-lo da inexistência de pulcritude na mensagem, porque negou uma referência a Zeca Afonso, porque foi descuidado com Manuel Alegre o verdadeiro Camões das canções da liberdade.

Mas seria injusto se dissesse que Pedro Nuno foi o único a falhar.

Ao longo destes meses, quase todos se têm esquecido de Soares. Nem a inexistente Comissão das Comemorações foi além da caixa de correio em que transformou, nem as escolas e universidades quiseram saber do grande socialista e democrata, nem sequer as televisões quiseram voltar a olhar para o papel único do grande vulto de Abril. Nada, até hoje. Soares comemoraria, este ano, o seu centenário e que bom seria começar a dele falar em Abril e terminar em Dezembro, na data do seu nascimento.

Fizeram de Eanes, que não esteve nas operações em Abril, o grande símbolo. E fizeram uma reinvenção da História porque Eanes foi líder no 25 de Novembro e porque foi o primeiro Presidente em eleições livres. Mas não está nesta personalidade nada mais.

Se tivesse que se juntar alguma coisa, poderíamos dizer que Eanes nomeou três governos de sua iniciativa contra os partidos, que utilizou o Conselho da Revolução para impedir a democratização da Constituição na sua primeira revisão, que construiu um agrupamento político caudilhista para fazer desaparecer os partidos centrais do regime, em especial o PS.

Eanes foi uma figura que saiu da política, na década de 1980, sem grande história, que se apressou a autorizar as candidaturas de Cavaco Silva por detestação a Soares, que se vai fazendo mito porque a direita portuguesa precisa, também, de um militar herói para o seu 25 de Novembro. Como eu lamento, há décadas, o ter integrado a Comissão Nacional de Apoio à sua recandidatura em 1981…

Esquecer Mário Soares, por estes dias, é um crime de lesa majestade. Tiveram de ser Aguiar Branco e Marcelo Rebelo de Sousa a deixar-lhe palavras que, da tribuna, a sua família política lhe negou. O PS deve olhar para isto como um sintoma.

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