Lula e Macron são saudados por fuzileiros navais em cerimônia de lançamento ao mar do submarino Tonelero, na Ilha da Madeira em Itaguaí (RJ)
Em visita ao país, presidente francês diz que pode ajudar Defesa, e fala em “projetos mais ambiciosos” no setor. Para ele, Brasil e França têm que falar com “firmeza e força” se não quiserem ser “lacaios” dos outros.Após ouvir do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que o Brasil quer construir um submarino com propulsão nuclear e desenvolver sua indústria de defesa para estar ao lado dos países que querem a paz, o presidente da França, Emmanuel Macron, disse nesta quarta-feira (27/03) que seu país está disposto a ajudar.
“Quero que nós abramos um capítulo para novos submarinos”, disse o francês ao participar da cerimônia de inauguração em Itaguaí, no Rio de Janeiro, do terceiro de cinco submarinos desenvolvidos em parceria com a Marinha do Brasil.
Macron, porém, ressaltou que a cooperação desejada pelo Brasil depende de garantias para o uso pacífico da energia nuclear. “Se você quiser, a França estará ao seu lado”, afirmou o político a Lula no segundo dia de sua viagem pelo país.
Pelo atual acordo, o Brasil ainda construirá seu primeiro submarino de propulsão nuclear com a ajuda dos franceses, o Álvaro Aberto, tornando-se o primeiro país a fazê-lo além dos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas – Estados Unidos, China, Rússia, Reino Unido e França.
Mas a propulsão nuclear da embarcação está sendo concebida somente pelos brasileiros, e dificuldades orçamentárias atrasaram o projeto, que deve ser concluído entre 2036 e 2037, segundo a Marinha.
Brasília tem tentado convencer Paris a aumentar a transferência de tecnologia para ajudá-la a integrar o reator ao submarino e permitir a compra de equipamentos que possibilitem a propulsão nuclear. A França, porém, tem relutado em ceder nesses pontos.
Defesa forte como dissuasão
Ao defender a construção do submarino com propulsão nuclear para a Marinha brasileira, Lula disse que o país quer desenvolver sua indústria de defesa para estar ao lado dos que querem a paz.
Segundo o petista, o Brasil quer dominar a tecnologia nuclear “não para fazer guerra”, mas “para garantir a todos os países que querem paz, que saibam que o Brasil estará ao lado de todos”, e que o país precisa de Forças Armadas “altamente qualificadas, preparadas e equipadas” para garantir a paz quando necessário.
Para Lula, a parceria militar franco-brasileira “mostra o interesse do Brasil em alcançar maior autonomia estratégica diante dos inúmeros conflitos que surgiram no mundo”, e uma defesa forte é, também, garantia em caso de “animosidades contra o processo democrático”.
Macron, por sua vez, sinalizou interesse em estreitar a cooperação militar entre os dois países e “lançar projetos mais ambiciosos” nas próximas décadas.
“Queremos que Brasil e França sejam grandes e poderosos porque a situação no mundo nos preocupa. E essa preocupação é também um pretexto para uma ambição ainda maior em que França e Brasil possam cooperar a serviço do mundo”, disse.
“Brasil e França têm que falar com firmeza se não quiserem ser lacaios dos outros”
Sem mencionar nenhum conflito específico, Macron ressaltou que os dois países têm “a mesma visão do mundo” e se recusam a ser prisioneiros da disputa entre duas potências. Defendeu ainda que nações do porte da França e do Brasil têm que falar com “firmeza e força”, se não quiserem ser “lacaios” de outras nações. “Temos de defender nossa independência, nossa soberania e o direito internacional.”
O contrato que o Brasil assinou com o estaleiro estatal francês DCNS para a produção dos cinco submersíveis exigiu um investimento de R$ 40 bilhões e inclui ainda a construção de um complexo industrial e de uma base de apoio às operações dos submarinos em Itaguaí. A parceira atual prevê a completa transferência de tecnologia apenas para submarinos convencionais como o Tonelero lançado nesta quarta – que deverá ajudar a patrulhar a costa brasileira.
Com a transferência de tecnologia prevista na parceria com a França, o Brasil terá ampliada a capacidade de projetar, construir, operar e manter seus submarinos.
Clima amistoso
Essa é a primeira visita de um chefe do Executivo francês ao país em mais de dez anos – a última havia sido em 2013, sob o socialista François Hollande.
A viagem ocorre após um período de distanciamento com a instabilidade política no Brasil a partir de 2015 e o clima de franca animosidade durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022).
Nas imagens que circularam até agora da visita, clicadas pelo fotógrafo oficial do Planalto, Ricardo Stuckert, nota-se um clima amistoso entre Macron e Lula – tal que internautas fizeram piada sobre elas lembrarem um ensaio de fotos pré-nupcial.
Paris celebrou abertamente o retorno de Lula ao poder a partir das eleições de 2022. No ano anterior, num recado claro a Bolsonaro, Macron chegou a receber Lula em Paris com um protocolo reservado a chefes de Estado, mesmo que à época Lula fosse apenas pré-candidato à Presidência.
No entanto, Macron e Lula ainda mantêm divergências em vários temas, como o acordo Mercosul-União Europeia e a Guerra na Ucrânia, por exemplo – dois assuntos que, até agora, não parecem ter sido discutidos entre os dois.
Sustentabilidade
A agenda de Macron, de três dias, começou na terça em Belém do Pará, com o anúncio de planos para criação de uma unidade de conservação nacional entre o Brasil e a Guiana Francesa, território ultramarino francês na fronteira com o Amapá.
O projeto, que deverá ter um investimento de 2 bilhões de dólares (R$ 9,96 bilhões) deve ser um centro de referência para a pesquisa científica voltada para o desenvolvimento sustentável.
Macron e Lula também lançaram um programa para levantar 1 bilhão de euros (cerca de R$ 5,4 bilhões) em investimentos públicos e privados dentro de quatro anos para projetos de bioeconomia (economia sustentável) na Amazônia Legal brasileira e, também, na Amazônia da Guiana Francesa. A ação faz parte do Plano de Ação sobre a Bioeconomia e a Proteção das Florestas Tropicais, assinado pelos dois países.
Macron embarca para São Paulo na noite desta quarta, onde deve encontrar empresários franceses durante o Fórum Econômico Brasil-França, na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Depois, participa de um jantar com artistas e personalidades da cultura brasileira, incluindo o cantor e compositor Chico Buarque.
Nesta quinta, Macron embarca para Brasília, onde será recebido com honras de chefe de Estado e se reunirá com Lula no Palácio do Planalto. Ali, os dois devem discutir temas como a reforma das instituições multilaterais e as guerras na Ucrânia e em Gaza.
ra/le (Agência Brasil, EFE, AFP, Lusa, ots)
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