Bateria de... algodão? As alternativas ao lítio e outros minérios desenvolvidas por cientistas e empresas

bateria de... algodão? as alternativas ao lítio e outros minérios desenvolvidas por cientistas e empresas

O uso de materiais alternativos pode ajudar a reduzir a extração de lítio e outros minérios para a fabricação de baterias

Puf! A luz acabou.

Mas, em uma rua na Índia, uma máquina de autoatendimento bancário segue funcionando alegremente, distribuindo dinheiro para as pessoas. Em parte, graças ao algodão queimado.

Essa máquina tem uma bateria de reserva no seu interior, que contém carbono proveniente de algodão cuidadosamente queimado.

“O processo específico é um segredo, para dizer a verdade”, afirma Inketsu Okina, chefe de inteligência da empresa japonesa PJP Eye, fabricante da bateria.

E ele não está brincando. “A temperatura é um segredo e a atmosfera é um segredo. A pressão é um segredo”, prossegue ele, cauteloso.

Okina conta que é preciso atingir alta temperatura – mais de 3.000 °C. E que 1 kg de algodão gera 200 g de carbono. Como cada célula de bateria precisa de apenas 2 g, o lote de algodão comprado pela empresa em 2017 segue sendo usado até hoje, segundo ele.

As baterias são formadas por três componentes básicos: dois eletrodos e um eletrólito entre eles.

Um dos eletrodos passa a ter carga positiva e é conhecido como cátodo, enquanto o eletrodo com carga negativa é chamado de ânodo.

Durante o uso, partículas carregadas chamadas íons fluem do ânodo para o cátodo através do eletrólito. Este fluxo permite o movimento dos elétrons ao longo dos fios do circuito elétrico conectado à bateria.

Nas baterias desenvolvidas pela PJP Eye, em conjunto com pesquisadores da Universidade Kyushu de Fukuoka, no Japão, o carbono é empregado para formar o ânodo – um dos dois eletrodos entre os quais fluem os íons, que são as partículas carregadas das baterias.

Os íons se movem em uma direção quando a bateria está sendo carregada e na direção oposta ao fornecer energia para um aparelho.

A maioria das baterias usa grafite como ânodo, mas a PJP Eye defende que sua abordagem é mais sustentável, já que ela pode produzir ânodos utilizando resíduos de algodão da indústria têxtil.

Com a imensa demanda por baterias prevista para os próximos anos, impulsionada pelo aumento dos veículos elétricos e pelos grandes sistemas de armazenamento de energia, pesquisadores e empresas vêm desenvolvendo freneticamente possíveis alternativas para as baterias de grafite e íons de lítio, tão comuns hoje em dia.

Como a PJP Eye, eles defendem que poderíamos utilizar materiais muito mais sustentáveis e facilmente disponíveis para a produção de baterias.

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A demanda cada vez maior por veículos elétricos requer o desenvolvimento de materiais sustentáveis para a fabricação de baterias

Prejuízo ambiental

A mineração de lítio pode causar impactos consideráveis ao meio ambiente. A extração do metal exige grandes quantidades de água e energia e o processo pode deixar imensas cicatrizes no terreno.

O lítio recuperado costuma ser transportado do local de mineração por longas distâncias, até ser refinado em países como a China. E o grafite também é extraído da natureza ou produzido a partir de combustíveis fósseis, ambos com impactos ambientais negativos.

“É muito fácil imaginar qual pode chegar a ser o tamanho da pegada de carbono à medida que o material das baterias passa pela extração e transporte”, segundo Sam Wilkinson, analista da empresa fornecedora de informações e análise de mercados S&P Global Commodity Insights.

Outro exemplo é o cobalto, empregado em muitas baterias de íons de lítio. O metal é extraído predominantemente na República Democrática do Congo – e existem relatos de perigosas condições de trabalho naquele país.

Da água do mar até os biorresíduos e pigmentos naturais, existe uma longa lista de possíveis alternativas naturais, disponíveis muito mais facilmente. O difícil é comprovar que qualquer uma delas pode competir de forma realista com as baterias existentes no mercado, aparentemente tão indispensáveis no nosso mundo repleto de aparelhos.

A PJP Eye também propõe a possibilidade de melhorar o desempenho das baterias e torná-las mais verdes.

“A superfície do nosso carbono é maior que a do grafite”, segundo Okina. Ele descreve como a química do ânodo da sua bateria de carbono único da marca Cambrian permite que ela seja carregada com rapidez até 10 vezes maior que as baterias de íons de lítio existentes.

O cátodo da bateria é feito de um óxido de “metal básico”. Okina não conta exatamente qual é esse metal, mas eles incluem cobre, chumbo, níquel e zinco, que podem ser obtidos mais facilmente e são menos reativos do que metais alcalinos como o lítio.

A empresa afirma que está desenvolvendo uma bateria de eletrodos de carbono duplo, com os dois eletrodos feitos de carbono de origem vegetal. A tecnologia é baseada em pesquisas realizadas por pesquisadores da Universidade Kyushu, mas a bateria não deve estar disponível antes de 2025.

Poder carregar uma bateria rapidamente não faz muita diferença para uma máquina de autoatendimento bancário, mas é importante para veículos elétricos, quando você deseja abastecer para seguir viagem.

Okina menciona que a empresa chinesa Goccia, em parceria com a japonesa Hitachi, desenvolveu uma bicicleta elétrica alimentada pela bateria da PJP Eye, que será colocada à venda no Japão. Okina afirma que a velocidade máxima da bicicleta é de 50 km/h e você pode percorrer uma distância de 70 km com uma única carga.

Mas ela ainda está distante da única bateria que usa carbono proveniente de biorresíduos. Stora Enso, na Finlândia, desenvolveu um ânodo de bateria que usa carbono de lignina, um polímero aglutinante encontrado em árvores.

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A extração de lítio causa graves danos ao meio ambiente, muitas vezes transformando toda a paisagem local

O algodão também pode ser usado no lugar do eletrólito que possibilita o fluxo de íons entre o cátodo e o ânodo, potencialmente criando baterias de estado sólido mais estáveis que as existentes hoje em dia, segundo alguns pesquisadores.

Mas há quem vislumbre fontes de energia maiores e potencialmente inexauríveis na natureza.

Os vastos oceanos do planeta representam um depósito “praticamente ilimitado” de material para baterias, segundo Stefano Passerini, vice-diretor do Instituto Helmholtz em Ulm, na Alemanha.

Ele e seus colegas descreveram o design de uma bateria que transfere íons de sódio da água do mar, para construir um depósito do metal sódio, em um documento publicado em maio de 2022. Para isso, a equipe projetou um eletrólito de polímero especial, através do qual podem passar os íons de sódio.

Aqui, a água do mar age como cátodo, ou o eletrodo com carga positiva. Mas não existe ânodo, pois o sódio não recebe carga negativa. Ele apenas se acumula em forma neutra.

Passerini afirma que podem ser utilizados excedentes de energia solar ou eólica para acumular o sódio, que pode permanecer ali até que seja necessário.

“Quando você precisar da energia, pode reverter o processo e gerar eletricidade”, explica ele, descrevendo como o metal seria simplesmente devolvido para o oceano.

Mas existem dificuldades neste processo. Resumidamente, o sódio, de forma muito similar ao lítio, reage energeticamente quando entra em contato com a água. Nas palavras de Passerini, “você tem uma explosão”.

Por isso, é fundamental garantir que não haja vazamento de água do mar para o depósito de sódio, para evitar que ocorra o desastre.

Essa possibilidade levou outros pesquisadores a buscar um material encontrado naturalmente nos nossos ossos e dentes, entre muitas outras fontes, como alternativa mais segura para os cátodos: o cálcio.

Ele pode, por exemplo, ser combinado com silício, o que ajudaria no transporte dos íons de cálcio para futuras baterias.

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Veículos elétricos e sistemas de armazenamento de energia devem puxar a demanda por baterias nos próximos anos

A lista de materiais que podem impulsionar baterias no futuro está ficando cada vez mais estranha.

George John, da Universidade da Cidade de Nova York, nos Estados Unidos, e seus colegas pesquisam há muito tempo o potencial de pigmentos biológicos chamados quinonas, encontrados em plantas e outros organismos, para uso como eletrodos de baterias.

Eles chegaram a atingir resultados promissores com uma molécula derivada de hena – a tintura usada em tatuagens, derivada da árvore da hena, Lawsonia inermis.

“Este é o nosso sonho”, afirma John. “Queremos fazer uma bateria sustentável.”

Segundo ele, um dos obstáculos é a forte solubilidade da molécula de hena natural. Quando usada como cátodo, ela se dissolve gradualmente em um eletrólito líquido.

Mas, combinando-se quatro moléculas de hena e acrescentando-se lítio, John explica que elas são capazes de produzir um material reciclável com estrutura de cristal, muito mais resistente.

“À medida que a cristalinidade aumenta, a solubilidade é reduzida”, explica ele.

John acrescenta que os designs de bateria desenvolvidos por ele e seus colegas podem não ter capacidade suficiente para alimentar veículos elétricos, mas, um dia, poderão ser usados em pequenos aparelhos vestíveis – talvez medidores dos níveis de açúcar no sangue em pessoas diabéticas ou outros indicadores, por exemplo.

Outros pesquisadores estudam o uso de materiais diferentes, como resíduos de milho e cascas de sementes de melão, para gerar novos tipos de eletrodos de baterias. Mas o desafio pode ser sua produção em escala, de forma a atender à demanda cada vez maior da indústria.

Aliás, o desafio permanente para qualquer material de bateria alternativo é sempre atender ao extraordinário aumento esperado da demanda.

Se continuarmos usando a tecnologia de baterias de lítio e grafite de hoje em dia, o mundo irá precisar de cerca de dois milhões de toneladas anuais de grafite até 2030, para satisfazer a crescente indústria de baterias, segundo estima o analista Max Reid, da consultoria Wood Mackenzie.

Atualmente, o consumo anual é de 700 mil toneladas.

“A demanda irá triplicar, na verdade”, afirma ele. É por isso, em parte, que as alternativas ao grafite precisam atender esse alto nível. “Atingir essa escala será incrivelmente difícil para qualquer material novo.”

Alterar os processos de fabricação, eliminando o uso de grafite, seria muito caro e, possivelmente, um grande risco comercial, segundo a engenheira e cientista de baterias Jill Pestana, da Califórnia (EUA), que trabalha atualmente como consultora independente.

Ela é cética sobre o uso de biorresíduos para ânodos de carbono, pois as fontes desses resíduos nem sempre podem ser muito ecológicas. É o caso de uma plantação de árvores com má gestão da biodiversidade, por exemplo.

Por outro lado, em mercados com consumidores aparentemente preocupados com a sustentabilidade dos produtos adquiridos, materiais de baterias alternativos, provenientes de fontes adequadas, podem ter maiores chances – sejam as baterias feitas de carbono derivado de biorresíduos ou de qualquer outra substância potencialmente mais sustentável.

“O público pode desempenhar um papel importante, realmente impulsionando esses esforços”, indica Pestana.

Leia a versão original desta reportagem (em inglês) no site BBC Future.

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