Especialista revela: A produção orgânica pode atender a demanda mundial, mas é preciso alterar o modelo agroalimentar

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especialista revela: a produção orgânica pode atender a demanda mundial, mas é preciso alterar o modelo agroalimentar

Área regenerada no Distrito Federal Foto:

Hoje é dia 15 de abril, Dia Nacional da Conservação do Solo. Em homenagem à data, o Comida de Verdade vai falar sobre a agricultura regenerativa, que produz alimentos e dá condições para a natureza se recuperar.

Neste modelo, a produção interage com todo o entorno, com elementos, como: insetos e outros seres vivos, a água da chuva ou de irrigação e elementos como gases e nutrientes absorvidos e exalados pelos organismos ao redor, entre outros.

Para conhecer melhor a agricultura regenerativa, entrevistei o Diretor do Grupo Associado de Agricultura Sustentável (GAAS) Eduardo Martins. O movimento busca promover e expandir soluções sustentáveis e regenerativas de culturas integradas, com o objetivo de otimizar o uso dos recursos biológicos e naturais de cada região, para produzir alimentos saudáveis e gerar qualidade de vida.

Esta conversa é parte do movimento Conexão Solo Vivo, que reúne pelo mesmo propósito, pessoas, instituições e entidades da sociedade civil, interessadas na valorização e na divulgação de iniciativas positivas nos campos da pesquisa, da produção e da comercialização de orgânicos e de alimentos de base agroecológica, em todo País. O GAAS também faz parte desta rede.

– Eduardo, é possível dizer que a qualidade do solo interfere na nossa qualidade de vida? De que forma isso acontece?

E.M: “A saúde de um lugar e de suas pessoas dependem da saúde do solo. A agricultura industrial tratou o solo como substrato para as plantas, onde os insumos seriam essenciais para produzir. Mas na realidade os solos são a maior expressão de vida e complexidade que temos no nosso planeta, bilhões de anos que garantem o funcionamento dos ciclos vitais e a nossa existência. A qualidade do solo é o principal capital do agricultor e da sociedade. Somos o que comemos, comemos o que o solo nos disponibiliza. Sem solo de qualidade prospera a indústria de aditivos de alimentos e as suplementações de vitaminas e nutrientes”.

– Como é o trabalho do GAAS e o que é necessário fazer para ampliar a escala da agricultura regenerativa?

E.M: “No GAAS trabalhamos com a agricultura intensiva e extensiva, dedicada aos grãos voltados para exportação. Temos avançado em práticas regenerativas, temos buscado encontrar caminhos para ampliar a biodiversidade dos agroecossistemas, a primeira providência é reduzir, e se possível eliminar, os insumos ofensivos à vida. Na substituição utilizamos o que promove a vida, biológicos no lugar de fungicidas e inseticidas químicos, fertilizantes naturais em vez de fertilizantes químicos.

Também buscamos a diversificação das coberturas, com o mix de plantas de serviço e rotação de culturas. Com essa abordagem de aumento da biodiversidade, mesmo com as monoculturas, conseguimos reduzir de 60 a 80% dos insumos convencionais e manter os níveis de produtividade. Mas temos uma grande limitação que é a nossa dependência dos herbicidas. Para eles reduzimos o consumo em 30%, mas estamos trabalhando para eliminar.

O desafio está na capacitação dos produtores, pois pressupõe um novo paradigma de agricultura. Para grandes áreas são necessários novos equipamentos para escalar as práticas regenerativas, como a diversificação das coberturas, redução da intervenção mecânica no solo e corte e distribuição dos diferentes tipos de biomassas, estimulando a ciclagem de nutrientes. Também temos um desafio significativo para ajustar o desenho do sistema, conciliando as diferentes plantas requeridas”.

– O sistema agrícola convencional, que ainda predomina no País, visa, entre outros objetivos, aumentar a produtividade, sem aumentar as áreas cultivadas. Qual tem sido a consequência dessa forma de trabalho?

E.M: “A produtividade é a “cenoura” que nos é acenada para corrermos atrás. A promessa é que o uso dos pacotes tecnológicos nos levará para tetos produtivos cada vez maiores. Pressupõe o uso intensivo de agrotóxicos e fertilizantes solúveis, a adoção de sementes transgênicas associadas a venda casada de insumos, e ainda a torcida que o clima seja perfeito. Pois, essa forma de produção tem baixa capacidade de tolerar a seca. Na realidade, o modelo convencional envolve custos altos, baixa resiliência aos estresses hídricos, baixa contribuição para a qualidade do solo e qualidade nutricional decrescente da produção”.

 – A agricultura praticada pelo GAAS produz alimentos com melhor perfil nutricional?

E.M: “Temos testemunhado melhorias no perfil dos alimentos, com destaque para o aumento de micronutrientes, resultado do uso dos remineralizadores como rejuvenescedores dos solos e da ativação biológica do sistema. Em grãos é frequente a melhoria do perfil proteico, porém precisamos de pesquisas para confirmar os potenciais identificados pelos resultados empíricos.

Identificamos um potencial enorme para conciliar as práticas regenerativas com melhoramento genético, visando a responsividade aos manejos e o desenho de perfis nutricionais requeridos. Os desafios são enormes, mas temos capital humano e condições de produção para resgatarmos o papel da agricultura como fornecedora de alimentos de qualidade”.

– Um dos principais argumentos de defesa dos agrotóxicos é afirmar que apenas a produção orgânica não daria conta da demanda mundial por alimentos. Esta preocupação procede? O que poderia ser feito para ampliar essa produção? 

E.M: “Modelos agroecológicos de agricultura, como a produção orgânica, podem atender a demanda mundial, mas teremos que alterar o modelo do sistema agroalimentar global.

O que dependeria de um conjunto de vetores, como: O aumento da população global, que não deve alcançar os 10 bilhões de habitantes, para em seguida evoluir para reduções significativas do crescimento; o modelo econômico e social de muitos países e blocos, que são dependentes de alimentos externos, a possibilidade de maior segurança alimentar com produções locais e regionais, que é de difícil equacionamento, mas não impossível; a melhoria da dieta para bases saudáveis, que avança de forma lenta, porém pode ser determinante na agricultura, trocando quantidade por qualidade; um pequeno avanço regulatório para condicionar o processamento e a comercialização de alimentos, que se deu depois da pandemia, e que, junto com a educação alimentar, pode minimizar os riscos de comorbidades advindas das dietas; a evolução da renda dos países mais pobres para garantir acesso a alimentação de qualidade e a sucessão do paradigma da Revolução Verde para agriculturas com base agroecológicas, onde a biologia e a ecologia determinem as práticas e o manejo dos agroecossistemas.

Para a agricultura brasileira é fundamental entender essas tendências e se preparar para os seus impactos. Baseada na nossa experiência, podemos afirmar, incluindo a agricultura intensiva e extensiva, que é possível produzir reduzindo os custos, aumentando os serviços ecossistêmicos, melhorando o solo e a qualidade dos alimentos.

 – Grande parte dos insumos utilizados pelos agricultores brasileiros são importados e têm um alto custo, certo? Os bioinsumos têm surgido como uma alternativa a essa importação? O que são esses bioinsumos e como podem colaborar com os agricultores?

E.M: “Buscamos praticar uma agricultura de processos, antes dos insumos. Significa que orientamos nossas práticas para tratar as causas e não os sintomas. Quando definimos os melhores insumos em função do manejo, os biológicos são a primeira escolha. Os bioinsumos de produção própria são os preferidos, sejam comunidades das áreas naturais das áreas produtivas, ou os específicos.

Quando respeitadas as boas práticas, a produção própria de bioinsumos é segura e utilizada para substituir, principalmente inseticidas e fungicidas. Não contamina as pessoas, o ambiente e nem a produção. Hoje 55% dos agricultores brasileiros utilizam bioinsumos para pragas e doenças, reduzindo o uso de agrotóxicos, que segundo o Ibama, em 2022 teve venda de 500 mil toneladas de ingredientes ativos. A produção própria de bioinsumos começou em 2009, com um decreto do então presidente Lula, que estendeu a possibilidade dos produtores orgânicos para todas as outras agriculturas. Começamos a utilizar a modalidade em 2010.

Em quatorze anos, estimamos que a multiplicação própria de bioinsumos no Brasil é a maior iniciativa de redução de agrotóxicos do mundo. Hoje, infelizmente ameaçada pela Nova Lei do Agrotóxicos, recentemente aprovada pelo Congresso, onde o Senado Federal preferiu beneficiar a grande indústria de agrotóxicos, em detrimento dos agricultores. Falta muito para organizar e conhecer, mas estamos convencidos pela nossa prática, que é possível escalar a agricultura regenerativa do Brasil”.

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