Celebrada pelo governo, a sucessão de recordes na balança comercial desvia as atenções da dificuldade do Brasil de diversificar o comércio com o resto do mundo. Para chegar à marca histórica de US$ 339,7 bilhões exportados em 2023, o Brasil contou, como poucas vezes antes, com a China e seu inesgotável apetite por commodities.
Após a interrupção de tendência nos dois anos anteriores, explicada pela rígida política de covid zero, determinada por Pequim mesmo quando o resto do mundo relaxava as restrições da pandemia, a dependência da China nas exportações brasileiras voltou a subir em 2023. O país, conforme mostra o balanço final do ano passado, foi destino de 30,7% do total de produtos brasileiros embarcados.
Quando se acrescenta à conta os mercados do sudeste asiático que estão na zona de influência da China – como Malásia, Tailândia, Vietnã e Indonésia -, além de Cingapura, um hub portuário na Ásia, o porcentual somado das exportações diretas e a economias cujo crescimento está ligado ao gigante asiático sobe para 37,9%.
Para especialistas em comércio exterior, mesmo com a tendência de desaceleração da economia chinesa, essa dependência comercial não é por enquanto motivo de preocupação.
O Brasil, avaliam, deve continuar sendo um pilar na segurança alimentar da China, ao mesmo tempo em que a expansão da classe média chinesa abre oportunidades para enriquecer a pauta com seu maior parceiro comercial.
Os prognósticos do mercado para este ano apontam para manutenção das exportações em nível próximo ao recorde de 2023, com projeções também otimistas – de crescimento das vendas internacionais – para os próximos três anos.
Haverá problemas, no entanto, se o ciclo das commodities, por ora favorável ao Brasil, virar, já que os demais produtos não têm a mesma competitividade e escala para entrar em mercados internacionais. “No médio e longo prazo, é complicado depender tanto das exportações de commodities a um único país, seria melhor exportar produtos de maior valor agregado”, comenta João Ferraz, economista da Coface.
Nas últimas duas décadas, o caminho trilhado pelo Brasil foi na direção contrária ao da diversificação e qualificação de sua pauta de exportações, tanto em produtos quanto em destinos. Enquanto a indústria extrativa e a agropecuária expandiram a produção para atender, sobretudo, a China, a indústria de transformação perdeu espaço para a concorrência da própria China em mercados vizinhos, assim como teve que enfrentar as sucessivas crises na Argentina, mercado no exterior importante para máquinas e bens de consumo, incluindo automóveis, produzidos no Brasil.
Como resultado, soja, minério de ferro e petróleo, os três produtos mais vendidos pelo Brasil ao exterior, já respondem juntos por 37,2% das exportações brasileiras – até 18 anos atrás, não passavam de 10%. Por outro lado, os produtos da indústria de transformação, uma gama vasta e diversificada que vai de alimentos a aeronaves, caíram para 52,2% no ano passado. Na série estatística da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), iniciada em 1997, o último dado da parcela da indústria nas exportações brasileiras só não é pior do que o registrado em 2021 (51,3%), quando a produção foi afetada pela falta de componentes nas fábricas.
“Temos que torcer para a reforma tributária reduzir o mais rápido possível o custo Brasil e, assim, abrir a perspectiva de aumento nas exportações de produtos manufaturados”, afirma o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro.
Com a criação do IVA, o imposto sobre valor agregado, a reforma vai eliminar os resíduos tributários que minam a competitividade de produtos brasileiros no exterior.
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