Aos seis anos, Nuno Baltazar soube que a mãe tinha esquizofrenia: “Eu e os meus irmãos não sabíamos como agir, lembro-me de ter muito medo”

A doença mental de uma mãe ou de um pai pode ter um grande impacto nos filhos, que também acabam por ter um risco maior de desenvolver patologia psiquiátrica, explicam as psiquiatras Teresa Maia e Catarina Pereira no mais recente episódio do podcast “Que Voz é Esta?”. Nuno Baltazar, designer de moda de 48 anos, partilha a sua experiência enquanto filho de uma pessoa com esquizofrenia

aos seis anos, nuno baltazar soube que a mãe tinha esquizofrenia: “eu e os meus irmãos não sabíamos como agir, lembro-me de ter muito medo”

Aos seis anos, Nuno Baltazar soube que a mãe tinha esquizofrenia: “Eu e os meus irmãos não sabíamos como agir, lembro-me de ter muito medo”

Quando tinha seis anos, Nuno Baltazar soube que a mãe tinha esquizofrenia. O ambiente familiar era complicado. “Lembro-me de sentir muito medo, pela imprevisibilidade das suas ações e a forma como ela geria o dia a dia.”

Mesmo as visitas a casa da mãe, já após o divórcio dos pais, eram de “grande tensão”. “Eu e os meus irmãos não sabíamos como agir. A casa estava sempre muito desarrumada, não havia condições para dormirmos lá e era a nossa irmã mais velha que cozinhava para nós. As janelas estavam sempre fechadas. A ausência de luz era recorrente e marcou-me. Ainda hoje, não consigo estar em casa com as persianas das janelas fechadas. Sinto necessidade de ter luz, mesmo durante a noite.”

Ao mesmo tempo, Nuno e os irmãos não percebiam exatamente o que estava a acontecer. “Só sabíamos que aquela casa era diferente de todas as outras casas onde já havíamos estado”, conta o designer de moda de 48 anos.

O mais recente episódio do podcast de saúde mental do Expresso, “Que Voz é Esta?”, é sobre o impacto que a doença mental de uma mãe ou de um pai pode ter nos seus filhos, e a importância de acompanhar e dar apoio a estas crianças, jovens e adultos.

aos seis anos, nuno baltazar soube que a mãe tinha esquizofrenia: “eu e os meus irmãos não sabíamos como agir, lembro-me de ter muito medo”

Segundo Catarina Pereira, pedopsiquiatra e diretora do Serviço de Pedopsiquiatria do Hospital Fernando Fonseca (HFF), na Amadora, uma das principais dificuldades que estes filhos de pessoas com doença mental enfrentam é a falta de compreensão por parte de quem os rodeia. “Têm muitas dificuldades em ser compreendidos, sobretudo devido ao estigma que existe em torno destas questões.”

Por outro lado, a “lealdade” em relação aos pais impede que, muitas vezes, falem sobre o que se passa em casa. No caso das crianças, é comum sentirem-se “responsáveis ou culpadas” por determinadas emoções dos pais — como a irritação — que, na verdade, são resultado da doença, explica a pedopsiquiatra. Podem surgir vários problemas a médio prazo, nomeadamente na escola, como “dificuldades de aprendizagem e exposição a situações de ‘bullying'”.

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Catarina Pereira, pedopsiquiatra e diretora do serviço de Pedopsiquiatria do Hospital Fernando da Fonseca, na Amadora.

Filhos ou filhas de pessoas com patologia psiquiátrica têm um risco maior de desenvolver, eles próprios, doença mental. Segundo Teresa Maia, diretora do Departamento de Saúde Mental e do Serviço de Psiquiatria do HFF, e professora na Escola Nacional de Saúde Pública, em Lisboa, um terço pode vir a desenvolver uma doença ao longo da vida; um terço pode desenvolver sintomas que não evoluem necessariamente para uma patologia; e outro terço vai crescer sem desenvolver “grandes problemas”.

Doença dos pais não é uma sentença

É importante, ressalva, não encarar a possibilidade de estas crianças e jovens desenvolverem doença mental como uma fatalidade — até porque “os genes expressam-se ou não em função de outros fatores, como os ambientais”. “O mais importante é incluir os filhos no acompanhamento que é dado a pessoas com doença mental e atuar de forma preventiva junto dessas crianças.”

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Teresa Maia, diretora do Departamento de Saúde Mental e do Serviço de Psiquiatria do Hospital Fernando da Fonseca, na Amadora. Também é professora na Escola Nacional de Saúde Pública, em Lisboa.

É precisamente isso que é feito no âmbito do projeto Semente, criado em 2015 pelo Departamento de Saúde Mental do HFF. Trata-se de uma iniciativa pioneira que promove a saúde mental dos filhos de pessoas com patologia psiquiátrica. São desenvolvidas intervenções para ajudar estas crianças e jovens a entender a doença dos pais e a lidar com as suas próprias angústias e problemas, numa lógica de prevenção, explica Teresa Maia.

Mais recentemente, em 2019, o departamento implementou outro programa Semente (Semente Gravidez e Primeiros Anos de Vida), dirigido às grávidas com doença mental. Neste episódio do podcast “Que Voz é Esta?”, explicamos de que se trata e até que ponto o acompanhamento e apoio dado a estas mulheres pode realmente prevenir o aparecimento de patologia nos seus filhos.

aos seis anos, nuno baltazar soube que a mãe tinha esquizofrenia: “eu e os meus irmãos não sabíamos como agir, lembro-me de ter muito medo”

“Que voz é esta?” é o nome do podcast do Expresso dedicado à saúde mental. Todas as semanas, as jornalistas Joana Pereira Bastos e Helena Bento dão voz a quem vive com ansiedade, depressão, fobia ou outros problemas de saúde mental, ouvindo igualmente os mais reputados especialistas nestas áreas. Sem estigma nem rodeios, fala-se de doenças e sintomas, tratamentos e terapias, mas também de prevenção e das melhores estratégias para promover o bem-estar psicológico. O podcast conta com o apoio científico de José Miguel Caldas de Almeida, psiquiatra e ex-coordenador nacional para a saúde mental.

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