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Fundada em 1812 nos EUA, a New England Journal of Medicine (NEJM) é uma das revistas científicas mais renomadas do mundo, conhecida por publicar pesquisas importantíssimas na área de medicina. Mas há uma mancha na história deste periódico: ele deliberadamente fez vista grossa aos crimes cometidos pelos nazistas durante as décadas de 1930 e 1940, e só condenou tais atrocidades muitos anos depois de outras revistas científicas igualmente prestigiadas.
É o que revelou um novo artigo publicado na própria New England Journal of Medicine e escrito por dois historiadores da ciência da Universidade Harvard, a convite do próprio periódico.
A análise dos pesquisadores mostra que, durante todo o período de domínio nazistas na Alemanha, o periódico se calou sobre as atrocidades cometidas na Europa em nome da ciência. Vale lembrar que a ideologia nazista era baseada na crença de uma raça superior, “ariana”, usando argumentos supostamente científicos para tentar provar essa mentira. Com essa justificativa, os médicos e cientistas do regime conduziram experimentos antiéticos e ilegais, além de, claro, perseguir e matar judeus e outras minorias no país.
O que o artigo aponta, porém, é uma grande apatia do NEJM em relação ao que acontecia na Europa. O assunto quase não era abordado, apesar de ser relevante para as áreas de medicina e ciência no mundo todo.
Uma das poucas vezes que um texto publicado na revista falou da situação da Alemanha foi em 1935, quando um artigo foi publicado pelo americano Michael M. Davis descrevendo as mudanças feitas no sistema de saúde do país pelo governo Hitler. O estudo descrevia e elogiava o foco do regime na saúde pública, mas ignorava totalmente as perseguições aos judeus e outros abusos do governo – que, naquela altura, já eram sim conhecidos e noticiados pela mídia americana.
Mais importante que isso, porém, é o fato de que essa postura era uma exceção. Outros periódicos científicos da época cobriam o assunto com profundidade. É o caso do Journal of the Medical Association (JAMA), também bastante respeitado na área de medicina. Na década de 1930, o periódico falou diversas vezes, em tom crítico, da perseguição de Hitler contra médicos e cientistas judeus.
Outra revista científica importante, a Science, também denunciou em artigos os abusos do governo nazista, focando nas perseguições aos judeus, repressão da liberdade acadêmica e na militarização da ciência e da educação.
Ou seja: não dá nem para a NEJM alegar que não sabia do que estava acontecendo na Alemanha, ou de que isso não teria relevância nos campos da ciência e da medicina. Também não dá para afirmar que é uma visão anacrônica do problema – os exemplos de seus pares estão aí para provar.
A primeira vez que o New England Journal of Medicine condenou explicitamente as atrocidades nazistas foi em 1949, quatro anos após o fim da Segunda Guerra Mundial. Hoje, reconhece que isso foi um erro.
O novo artigo é fruto de uma iniciativa da própria revista científica de olhar para o passado. O NEJM está publicando uma série de análises feitas por historiadores independentes para entender como o jornal, ao longo da história, ajudou a perpetuar preconceitos e injustiças, especialmente na área médica. “Esperamos que [essa iniciativa] nos leve a aprender com os nossos erros do passado e a evitar novos”, diz a revista.
Antes do estudo sobre o nazismo, esse mesmo projeto levou a publicação de um outro artigo que mostrou como o NEJM simpatizou com as ideias eugenistas da ciência no século 19.
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