Machado de Assis é jovem e rapper em peça que adapta as memórias de Brás Cubas

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Ao montar há dois anos o espetáculo “Neva”, do chileno Guillermo Calderón, a Armazém Companhia de Teatro viveu uma espécie de descarga emocional após os anos de pandemia e de ataques à cultura protagonizados pelo bolsonarismo.

Sem patrocínio, o grupo reutilizou materiais que estavam guardados e levou à cena uma peça que abordava a desimportância do teatro.

“Precisava falar sobre a falta de esperança que naquele momento estava se abatendo sobre a gente”, diz o diretor Paulo de Moraes.

Depois da temporada de “Neva”, e com as artes voltando a ganhar força, ele teve vontade de fazer o contrário —colocar a teatralidade de volta ao palco, misturada a outras linguagens como a literatura e a música.

A adaptação de “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, obra-prima ácida e ao mesmo tempo bem- humorada publicada em 1881 por Machado de Assis, foi a escolha da companhia para o retorno aos alicerces do teatro.

“Eu queria trabalhar com Machado porque acho que ele é o representante máximo de brasilidade. Queria fazer um movimento de teatralidade e de uma certa positividade, mas sem perder o senso crítico”, afirma o diretor. “Ele faz uma leitura sobre a formação da elite brasileira. Por que a gente é assim? Por que a gente se transformou em um país com uma desigualdade absurda?”

Com dramaturgia de Maurício Arruda Mendonça, “Brás Cubas”, em cartaz no Sesc Santo Amaro, insere o próprio escritor na peça, como personagem interpretado por Bruno Lourenço. E Brás Cubas é desmembrado em dois —Sérgio Machado interpreta o personagem desde o nascimento até a morte, e Jopa Moraes faz o defunto.

Não nessa ordem, porque é contemporâneo não ter uma estrutura linear, como brinca o texto da peça.

A história é contada em quatro planos. Brás Cubas defunto, Brás Cubas em sua trajetória de desejos e frustrações, Machado e o multi-instrumentista Ricco Vianna, que proporciona um ritmo “rock and roll” ao espetáculo. Todos são protagonistas, inclusive a trilha musical. O ponto central da adaptação é o delírio que o personagem principal tem momentos antes de sua morte.

E tem a lousa que faz parte do cenário, mas não apenas isso. Ao longo da peça, Bruno Lourenço materializa as palavras ao escrever fragmentos da história no quadro, com sua caligrafia perfeita. “No final, parece que uma vida passou por ali”, diz Moraes.

Algumas vidas, é possível afirmar. Uma delas é a de Machado com o recorte proposto pelo espetáculo, isto é, um jovem negro, intelectual, escritor, poeta e já com a ironia que marcaria as suas análises da elite brasileira.

“Eu ficava pensando quem era esse cara até os 33 anos, o que ele poderia dizer para a nossa juventude”, afirma Lourenço, referindo-se à idade em que o escritor publicou seu primeiro romance.

Nas festas à fantasia da infância, o ator pensava em Martin Luther King como inspiração e achava estranho não ter um brasileiro como modelo. “Se tivesse tido essa referência do Machado preto, outras possibilidades teriam sido criadas”.

Ao usar o rap para declamar um trecho do texto machadiano, Bruno ajuda a “tirar a poeira” de um escritor que muitos jovens enxergam apenas como leitura obrigatória para o Enem.

Jopa Moraes conta que um dos maiores desafios da montagem foi conseguir levar ao palco a graça e a crítica ferina presentes na literatura do escritor do Cosme Velho, que criou um defunto autor e dedicou o livro “ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver”.

“A gente sabia que estava lidando com uma obra espetacular, mas também traiçoeira, difícil, sutil”, diz.

A música, as cenas coreografadas, o cenário manipulado na frente do público e algumas referências políticas atuais são elementos que se aliam à obra de Machado, escrita em 1880 e ainda sarcástica e moderna, na missão de conquistar o público.

Em outubro de 2023, “Brás Cubas” participou do Festival Internacional de Teatro de Wuzhen, na China, ao lado de nomes como Robert Wilson e Joël Pommerat. Em outubro deste ano o espetáculo será apresentado no Pacific International Theatre Festival, em Vladivostok, na Rússia. Em seguida, retorna à China para uma turnê nos meses de outubro e novembro.

O público chinês no festival era predominantemente jovem e feminino, assistiu à peça com legendas e, ao rir nos momentos de humor, provou que Machado ultrapassa fronteiras.

BRÁS CUBAS

Quando Até 5 de maio. Sextas, às 21h, sábados, às 20h, e domingos, às 18h

Onde Sesc Santo Amaro – r. Amador Bueno, 505

Preço R$ 30 a R$ 60

Elenco Sérgio Machado, Jopa Moraes, Bruno Lourenço e Isabel Pacheco

Direção Paulo de Moraes

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